Água para todos, artigo de Pedro Brito
Brito escreveu este texto para o debate da ‘Folha de SP’ sobre a transposição do Rio São Franscisco, em que se manifestou a favor da obra
O Projeto de Integração da Bacia do São Francisco às Bacias dos rios intermitentes do Nordeste Setentrional tem um claro e importante objetivo: dar segurança hídrica a uma população de 12 milhões de pessoas e permitir o desenvolvimento social e econômico da região.
O projeto pretende captar continuamente, para o consumo humano e animal, 26 m3/s, ou seja, 1% da água que o rio joga no mar. Quando, e só quando, a barragem de Sobradinho (a jusante da qual a captação será feita) estiver cheia ou vertendo, o volume captado poderá alcançar até 114m3/s, ou seja, 2,5% do que vai para o oceano.
A água será levada por dois canais um na direção norte, outro na direção leste até os açudes estratégicos já existentes em Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, a partir dos quais e por rede de adutoras já construídas ou em construção ela abastecerá pequenas, médias e grandes cidades daqueles Estados.
O projeto não terá qualquer impacto ambiental negativo acima ou abaixo da barragem de Sobradinho.
Pelo contrário, pela primeira vez na história do rio, há em execução um programa de revitalização ambiental da bacia do São Francisco, beneficiando, principalmente, Minas Gerais, onde ele nasce na Serra da Canastra e onde se localizam seus principais focos de degradação as usinas mineiras que produzem gusa derrubam árvores e as utilizam como carvão.
O orçamento de 2005 dos ministérios da Integração Nacional e do Meio Ambiente tem dotações de R$ 100 milhões com essa finalidade.
O Ministério das Cidades vêm investindo R$ 620 milhões em projetos de saneamento básico e de abastecimento de água em 86 cidades da bacia do São Francisco, cuja revitalização é um trabalho de longo prazo e de responsabilidade dos governos da união e dos estados e municípios que a integram.
A intregação de bacias permitirá a sinergia hídrica, ou seja, grande parte da água dos açudes que hoje se perde pela evaporação, nos anos secos, ou pelo vertimento, em anos chuvosos, será aproveitada permanentemente para diferentes usos.
Assim, os açudes não precisarão mais permanecer cheios na expectativa de que o próximo ano será de seca. Quando eles forem recarregados pela água das chuvas, as bombas do projeto serão desligadas e só serão religadas quando isto se fizer necessário, ou seja, nos anos secos. Esta é a grande inovação do projeto São Francisco.
Há mais inovação: para evitar a especulação fundiária, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva baixou decreto, considerando de utilidade pública para efeito de desapropriação com fim social, 2,5 km de terras nas margens direita e esquerda dos dois canais.
Essa área, de cerca de 350 mil hectares, 50 mil dos quais próprias para a agricultura, será utilizada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário para projetos de reforma agrária. Ao longo dos canais norte e leste serão instalados grandes chafarizes, que abastecerão, gratuitamente, 400 pequenas comunidades.
Os opositores do projeto, alguns por desinformação, outros por má fé, afirmam que o seu custo é muito caro e que o governo teria melhor resultado se aplicasse esses recursos em programas de cisternas e de perfuração de poços.
A verdade é a seguinte: na primeira etapa do projeto, que é a mais importante, serão investidos R$ 4,5 bilhões. Isto representa o custo social de duas secas e quer dizer, muito claramente, que a pior opção é não executar o projeto de integração de bacias.
Para atender as populações dispersas, o governo já vem executando o programa de construção de um milhão de cisternas, o de perfuração de poços e o de construção de pequenos reservatórios.
O projeto São Francisco, vale repetir, destina-se a levar água para os centros urbanos do semi-árido setentrional, livrando-os dos constrangimentos do racionamento. Campina Grande, segunda maior cidade da Paraíba, com quase meio milhão de habitantes, sofre há anos esse constrangimento.
Também alardeiam os opositores que o rio não dispõe da água necessária à operação do projeto. É outra inverdade: a Agência Nacional de Águas (ANA), que, por lei, é a responsável pelas outorgas de água, já disse o contrário.
Além disso, a ANA está revendo cada uma das outorgas já concedidas, uma vez que várias delas já caducaram e talvez não sejam renovadas porque nunca foram usadas. Outra acusação dos opositores insinua que a tarifa da água a ser cobrada dos usuários, quando o projeto estiver em operação, ‘será a mais cara do mundo’.
Aqui não se trata de desinformação, mas de pura má fé: o custo de operação do projeto está estimado em R$ 0,11 por metro cúbico. Exatamente: onze centavos de real. Para que se tenha uma idéia do que isto significa, basta dizer que em Múrcia, na Espanha, onde se fez a integração do rio Tajo (o mesmo rio Tejo que banha Portugal) com bacias de outras regiões espanholas, o custo da água é de 15 centavos de euro por metro cúbico, ou seja, quatro vezes mais.
Em resumo: o projeto é tecnicamente perfeito, socialmente justo e ambientalmente sustentável.
Pedro Brito, economista, é chefe de gabinete do ministro da Integração Nacional e coordenador-geral do Projeto São Francisco. Artigo publicado pela ‘Folha de SP’:
(Folha de SP, 20/2)